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Falar de futuro pode ser uma tarefa árdua, ainda mais no cenário atual, onde a pandemia desmembrou os “futuros possíveis” em um emaranhado de possibilidades. Vale dizer que ser futurista está longe de ser dono de uma bola de cristal mágica, e está mais próximo de um heavy user de notícias, tendências e dados. Mas, como fazer isso em um mundo caótico, onde forças disruptivas transformaram tendências de longo prazo em cotidiano (era o caso do home office, antes previsto para os próximos 5-10 anos e agora parte do nosso dia a dia)? A resposta mais simples para este questionamento é: “observe o micro, para anteceder o macro“. 

Neste texto de estreia, trago – sob uma ótica crítica – 5 tendências que as marcas precisam ficar atentas para o ano de 2023. São cinco movimentos, tecnologias e, até mesmo, iniciativas que podem interferir na forma como nos comunicamos, vivemos em sociedade ou transformamos o nosso dia a dia.

Em diferentes níveis de amadurecimento, a lista abaixo começa por tendências que já vem se consolidando nos últimos anos, até chegarmos às perspectivas mais futuristas ou, até mesmo, que dependem de outros fatores para serem implementados. Uma coisa é certa, se você é um early adopter, com certeza elas farão parte do seu estilo de vida nos próximos anos.

1. Wearables: Um mundo que começa nos smartwatches

Os wearables, ou dispositivos vestíveis, despontam como uma das grandes tendências há alguns anos. Segundo dados da IDC Brasil, em 2020 foram vendidos 1.394.857 fitbands e smartwatches, e 569.781 fones de ouvido truly wireless com alguma conexão com a internet ou função inteligente. Além disso, segundo relatório da Grand View Research, o mercado global de wearables deve atingir US$ 186,14 bilhões até 2030.

Esta perspectiva se dá porque os dispositivos vestíveis evoluíram consideravelmente nos últimos anos. De simples monitores cardíacos para atividades físicas, eles se transformaram no que existe de mais próximo em trazer o mundo digital para o mundo físico. Isso sem contar nos sensores que podem monitorar diversas reações fisiológicas do nosso corpo.

Por exemplo, o Apple Watch Series 8 (apresentado em setembro de 2022) possui sensores de temperatura e impacto, que permitem o relógio inteligente monitorar o ciclo menstrual, incluindo o período de ovulação; ou identificar se o usuário sofreu um acidente de trânsito e acionar os serviços de emergência. Já o modelo mais potente, o Apple Watch Ultra, permite que o usuário tenha um GPS preciso no pulso, além de sirene de emergência, medidor de profundidade e bússola. Tudo isso sem a necessidade de estar conectado a um smartphone.

No entanto, estes exemplos da Apple são apenas o início de um mercado imenso, não apenas em valores, mas em oportunidades de novas tecnologias e impacto social. Soluções como o Maptic, criado pelo designer de produto britânico Emilios Farrington-Arnas, são ótimos exemplos de como as tecnologias vestíveis podem impactar a vida das pessoas. Criado em 2017, o protótipo é composto por um conjunto de dispositivos (incluindo um sensor visual), que pode ser usado como um colar; e uma série de pontos de aviso, que podem ser usados na roupa ou no pulso.

Outro tipo de wearable que vem sendo trabalhado há anos são os óculos de realidade aumentada. Aqui vale um comentário importante, a Apple não é conhecida apenas por inovar mercados, mas também por lançar tecnologias no momento certo. Foi assim o iPhone, em um cenário onde as telas touchscreen já eram realidade, e pode ser assim com o óculos de realidade mista (VR/RA).

Segundo o analista Ming-Chi Kuo, conhecido por adiantar lançamentos da empresa, a Apple deve lançar seu óculos de realidade aumentada no segundo semestre de 2023. Ainda segundo Kuo, o modelo é considerado pelo mercado de headsets VR/AR como o “próximo impulsionador de crescimento crítico para a indústria óptica”.

Este é apenas o início de um cenário futuro onde tecnologias vestíveis e conectadas são tendências e nos trarão potencial de interação entre o mundo virtual e o físico, potencializando a atuação das marcas no cotidiano dos consumidores.

2. Metaverso: (re)Inventando a roda e encontrando significados

Metaverso deve ser considerada a palavra do ano e uma das grandes tendências. O segundo semestre de 2022 viu o termo estar presente em todos os noticiários, mas ninguém sabe ao certo o que é, para que serve ou se realmente precisamos do metaverso. Impulsionado pela Meta (antiga Facebook), que levantou a bandeira do mundo virtual como quem se agarra ao último bote salva-vidas, o metaverso está longe de ser um universo de realidade virtual, como o apresentado por Zuckerberg.

Se nos parágrafos anteriores falamos sobre os óculos de realidade mista como uma tendência de wearables, como podemos dizer que o metaverso com realidade virtual já é uma realidade? Restrito a dispositivos pesados e cheio de cabos, este tipo de metaverso ainda é muito limitado. Mas metaverso não se resume apenas a isso!

Leia também: Quem é o metaverso na fila do pão?

Metaverso significa mundo virtual. E se tem um público que conhece bem sobre mundos virtuais são os gamers. Só que até este cenário mudou. Se antes os games eram plataformas restritas, com começo, meio e fim; hoje eles viraram plataformas de entretenimento, que recebem shows, experiências com marcas e extrapolam a criatividade. Ou seja, não há necessidade de criar metaversos do zero, quando há plataformas já consolidadas. Fazendo uma analogia, é como se a marca adotasse o discurso de “farei uma ‘cópia do Facebook’, porque quero ter a minha rede social”.

A minha sugestão é… Se o seu core business não for metaversos, utilize aqueles que já existem. Uma solução para quem quer “fugir” dos games é o aplicativo Gather, que vem criando pequenos metaversos corporativos e sendo utilizado até para equipes em trabalho remoto. Agora, se o seu core business for entretenimento, aí os games podem ser um universo de oportunidades e uma das tendências mais importantes.

Em julho de 2022, durante o episódio n.07 do Com limão Drops, conversei com Henrique “Sharshock” Mancini, sócio fundador da Pixel Hunters, startup especializada na criação de metaversos (mapas criativos) exclusivos para o Fortnite – ouça abaixo. O jogo, lançado em 2017, tem recebido shows – Emicida e Ariana Grande são apenas alguns dos nomes que já passaram pelo metaverso da EPIC –, além de experiências imersivas com marcas para lançamentos de produtos, serviços e até como votar na urna eletrônica (veja abaixo).

3. Web3, DAOs e NFTs: Esqueça as redes sociais atuais, o futuro é descentralizado

Um dos próximos grandes desafios será a migração da web2 para a web3. Talvez uma das tendências mais impactante, mas mais difícil de explicar, se antes tínhamos serviços digitais no centro e os usuários em volta (modelo tradicional das redes sociais, por exemplo), no novo formato teremos o usuário no centro, principalmente quando o assunto são dados pessoais. Nas redes descentralizadas, o usuário decide se quer ou não, e qual tipo de dado irá compartilhar com a plataforma.

Segundo a Synergy Research Group, atualmente a web2 passa por três grandes empresas. Amazon, Google e Microsoft controlam mais de 73% do mercado de armazenamento de dados em nuvem. Nós, usuários, compartilhamos dados pessoais para personalizar as experiências de uso, mas ficam suscetíveis ao vazamento ou venda dos dados. Um dos conceitos fundamentais da web3 está na tokenização dos dados, ou seja, o registro digital de dados em uma rede blockchain (que por si só é uma das grandes tendências tecnológicas).

A blockchain é uma cadeia de blocos que possibilita inúmeras transações simultâneas, com o diferencial de não depender de uma só entidade validando as transações, mas sim de milhares de computadores validando. As transações são registradas nos blocos e esses blocos permanecerão eternamente na blockchain, sem que as operações possam ser revertidas, afinal, o movimento é unicamente linear.

Outro exemplo de como a web3 pode mudar a forma como consumimos as redes e porque colocamos este ponto como uma das 5 tendências do ano, estão nas DAOs, ou organizações autônomas descentralizadas. Elas funcionam da seguinte forma: a) os fundadores criam um token de governança; b) esses ativos digitais são distribuídos entre os usuários, apoiadores e outros stakeholders da organização; c) cada token corresponde a uma quantidade definida de poder de voto dentro da DAO, e podem ser comprados ou vendidos conforme a vontade do proprietário – por isso muitas vezes estes tokens são confundidos com criptomoedas. Atualmente já existem DAOs no campo das ONGs e da saúde – leia mais aqui.

Por fim, os NFTs deixarão de ser simples imagens e passarão a ter utilidade. Apesar do token não-fungível já ter esta utilização, o hype fez com que a tecnologia torna-se sinônimo de “especulação digital”. No entanto, os NFTs são representações de uma linha de código que dá acesso a algo. Para ilustrar, imagine que você faça uma cópia de um cartão de débito. Você apenas está fazendo uma cópia, isso não quer dizer que você terá acesso ao crédito disponível em conta. O mesmo acontece com quem “baixar” uma imagem que representa um NFT. A imagem divertida é meramente ilustrativa – leia mais aqui.

Dois exemplos de marcas que vêm experimentando os NFTs como plataforma de marca são as Havaianas (projeto NFTh) e Reserva (projeto Pistol Birds). Projetos que, apesar de não terem tido o sucesso dos cases internacionais, já mostram o potencial da tecnologia no Brasil.

4. Negócios de impacto: Um modelo para mudar a sociedade

Apesar dos negócios de impacto não serem considerados uma das tendências (o modelo já vem sendo aprimorado há anos); a relação das empresas com a governança ambiental, social e corporativa (ESG) deve colocar os negócios de impacto no centro das oportunidades dos negócios. As marcas que não apresentarem ações concretas de impacto – seja ambiental ou social – correm o risco de caírem no greenwashing, socialwashing ou qualquer outro “washing” e estão fadadas à sentença por parte dos seus consumidores.

Os negócios de impacto são uma oportunidade de fortalecimento nas relações de empresas com o terceiro setor, sem que haja necessidade da aplicação dos antigos formatos de filantropia. Segundo a Quintessa, um negócio de impacto “nasce do desejo de protagonizar soluções para os grandes desafios sociais e ambientais – e também do desejo de oferecer essas soluções de uma forma escalável financeiramente sustentável, por meio da oferta de produtos e serviços, sem depender de doações”. Ou seja, as marcas e empresas podem estar presente em negócios de impacto, seja como apoiador, seja como investidor. 

Caso tenha interesse em se aprofundar no tema, recentemente fiz um podcast sobre o universo da inovação social e abordei o tema negócios de impacto, com alguns exemplos que já tive contato direto nos últimos anos, além de referências deste campo – ouça abaixo.

5. Cidades inteligentes: Um novo modelo de sociedade e centros urbanos

O home office veio para ficar. Se você é oposição ao formato, sugiro que repense sua opinião. O formato não é 100% e possui seus problemas (alguns, os quais, ainda vamos achar soluções), mas quando colocado na balança, o formato é mais positivo do que o antigo trabalho presencial. Mas o trabalho remoto não é apenas um reflexo do cenário pós pandemia, é também uma consequência da nova forma que as cidades têm se moldado.

Ficar 1 hora atrás do volante ou em pé no transporte público deve ser coisa do passado. No futuro próximo as grandes cidades devem se adaptar ao conceito de “cidade de 15 minutos”. Termo criado pelo cientista franco-colombiano Carlos Moreno, refere-se a uma cidade onde tudo o que precisamos está a apenas 15 minutos de distância a pé. Segundo o pesquisador, “após a Segunda Guerra Mundial, o planejamento urbano passou a ser concentrado em uma cidade funcional e produtiva, abandonando a noção de bem-estar”. Com o crescimento do número de pessoas que colocam o bem-estar no centro de necessidades básicas, esta forma de viver, centrada na produtividade, deve fazer com que a vida nos centros urbanos tenha que se adaptar para dar espaço à qualidade de vida, deixando a produtividade exclusivamente para o trabalho.

Será cada vez mais comum ver pessoas que trabalhem para empresas que, muitas vezes, nem estão presentes na mesma delimitação geográfica, ou seja, na mesma cidade ou em um município próximo. Talvez nem no mesmo país. Aquelas marcas que ignorarem este novo cenário, podem estar correndo o risco de ficar fora do radar de novos consumidores.

Entendo que esta mudança seja desconfortável para pessoas da minha geração, atualmente na faixa dos 35-40 anos, ou das gerações anteriores; mas é necessário entender que as gerações Z e Alpha já fazem parte de uma parcela representativa da força de trabalho e dos atuais consumidores. Ignorar as necessidades de um público que é nativo digital e anseia por novos formatos de trabalho e novas formas de “morar” nos expõe ao risco de assumir o papel de personagens  que adotam o discurso “na minha época…”, ou seja, de ultrapassados.

Imagem de capa: MontyLov/Unsplash

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