Na minha imaginação, eu sempre ficava pensando como seria a sensação de um comandante pilotando um grande avião com visibilidade zero. Como seria aterrissar em Guarulhos às 6h da manhã, no meio de um nevoeiro de inverno? Brrr, que medo!
Aí, do nada, eis que isso passa a ser minha rotina diária. Minha e de outros milhões de profissionais, que têm que operar suas empresas de casa, onde estão em quarentena pelo coronavírus. Só que esse vôo cego não é com um Boeing 777, super equipado eletronicamente e preparado para voar sozinho. Nossas empresas são mais ou menos como um ônibus articulado, desses enormes que rodam por São Paulo, onde o motorista terá que dirigir com uma venda nos olhos.
É mais ou menos isso que eu, meus sócios e mais 140 colaboradores estamos fazendo há cerca de 10 dias, desde que o corona nos ancorou em nossas casas. Home office total! Nós somos uma empresa de serviços, então acho que é menos difícil do que numa grande indústria, mas, mesmo assim, ainda temos que vender, assinar contratos, pagar fornecedores, fazer folha de pagamentos, recrutar, fazer reuniões de departamento, apresentações para os clientes e, obviamente, entregar de forma coordenada todos os serviços que vendemos. Gente, estamos fazendo, mas no começo é assustador!
Pensando nos desafios diários em tempos de coronavírus, achei que seria interessante compartilhar nossas primeiras experiências, enquanto muitas empresas ainda estão buscando seus caminhos. Dando um spoiler do que vou contar a seguir, a experiência tem sido desafiadora, mas muuuuito emocionante e recompensadora. Para mim e para meus sócios foi uma gratificante surpresa constatar a enorme criatividade, compromisso e colaboração do nosso time, para ajudar a dirigir (coletivamente) nosso ônibus, às cegas. E até aqui não acertamos nenhum poste e estamos entregando os passageiros direitinho em seus destinos.
Por onde começar a história? Pelos pilares, obviamente. Para nós, os 3 pilares de sustentação de uma gestão 100% por home office têm sido:
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Tecnologia;
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Rotina espartana, previamente combinada, e seguida com rigor;
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Colaboração e compromisso (absolutos).
Sobre a tecnologia.
Antes de mais nada, operar na nuvem. Nossa empresa já operava 100% na nuvem. Isso significa que todos vêem tudo (ou pelo menos aquilo que lhes é permitido) e podem mexer em tudo, se necessário, simultaneamente. Nós usamos os aplicativos office do Google Suite, mas se estivéssemos usando o equivalente da Microsoft, daria na mesma. Nosso ERP está na nuvem, a folha de pagamentos é terceirizada, mas interagimos com o fornecedor online, e todas as nossa plataformas de gestão de comunicação (monitoramento, social listening, distribuição de releases, preparação de relatórios, relacionamento com influenciadores, SEO, planejamento de mídia, etc) também estão na nuvem. E mais. Internamente não usamos e-mail e sim um super ágil sistema de mensageria corporativa. Nós usamos o Google Chat, mas no passado usávamos o Slack, como poderíamos usar outras plataformas. E por último, mas super importante: utilizamos o Hangout Meet do Google como plataforma de reuniões online, sem limitação do número de participantes, com áudio, vídeo e capacidade de compartilhar apresentações. Poderia ser quaisquer outras das múltiplas plataformas de vídeo conference que existem no mercado. Achei tão fácil que neste final de semana organizei a festinha de aniversário de meu neto por Hangouts. Todas as velhinhas (e velhinhos) da família conseguiram clicar no link e participar da festa, sem nenhum problema. Só não deu para comer uma fatia de bolo virtual, rsrsrs…
Sobre a rotina.
Sobre isso tem saído muito conteúdo na mídia, mas não custa reforçar. Trabalhar em casa é um desafio. Crianças, cachorro, TV, telefone, etc, são infindáveis os desafios que podem quebrar sua concentração. Então, ficam aí algumas dicas:
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Como se você tivesse que ir para o escritório, crie sua agenda de atividades e procure seguir à risca. Acordar cedo, academia na sala (home fitness, que pode ser dirigida pelo Youtube direto da TV), banho, café e seguir a agenda de trabalho bonitinho, como se estivesse no escritório. No horário de almoço, segui-lo como se estivesse no escritório, aproveitando o momento para relaxar. Se possível, resistindo à tentação do sofá e ao noticiário do almoço. Mas, tudo sem neura.
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Monte seu cantinho de trabalho. Pode ser no seu escritório (para quem tem um), na sala (pactuando com seu cônjuge, filhos ou companheiros de quarentena), na varanda, na cozinha… não importa. O que importa é que seja o seu cantinho, cuidado só por você, silencioso, sem interrupções e que te permita concentração absoluta.
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Respeito à agenda. Num vôo cego, qualquer um que se esqueça de um item da agenda, ou que entre atrasado numa sala de chat, atrasa e atrapalha todos os demais. Seja disciplinado e respeitoso, como você espera que os outros sejam.
Colaboração e Compromisso.
Essenciais! Uma vez eu fiz uma experiência incrível: ser dirigido numa sala às escuras e entulhada de móveis por um deficiente visual, que a conhecia como a palma da mão. Foi aterrorizante e recompensador ao mesmo tempo. Dirigir uma empresa e executar tarefas remotamente, e sem ver os demais participantes, é uma experiência parecida. Um tem que confiar no outro e colaborar, infinitamente. A hierarquia nesse momento vale muito pouco. O que vale de fato é o compromisso absoluto de cada membro do time. Ou seja, quando você for incumbido de uma tarefa, ou incumbir alguém, ambos têm que ter certeza que tudo que foi combinado vai acontecer. Descontados os inevitáveis erros e imprevistos decorrentes de qualquer tipo de tarefa.
Em síntese, é isso. Assustador, mas o aprendizado pode ser recompensador. Ao fim da experiência, empresas e pessoas já não serão as mesmas. A casca estará mais dura, teorias aprofundadas pela prática e a solidariedade lá em cima. E novos truques serão aprendidos, como a série aeróbica que eu aprendi com minha mulher, tirando o pó da sala e limpando os banheiros, rsrs. Have fun!
Por Augusto Pinto, sócio fundador da agência RPMA.