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Um problema que é recorrente não apenas na sociedade brasileira, mas em todo o mundo é a violência doméstica. Durante essa época de quarentena, todas as mulheres se tornaram mais vulneráveis as situações que passam dentro de casa. Sendo erroneamente estereotipada como realidade da classe baixa, a violência doméstica está em todos os ramos da sociedade e é mais comum do que se pode imaginar. 

Entre fevereiro e abril deste ano, houve um aumento de 431% de relatos no Twitter sobre brigas entre casais, por exemplo. Nas mensagens filtradas pela rede social, foram registradas 5.583 menções que indicavam a ocorrência de violência doméstica. Outro dado significativo é o fato de que a busca no Google por Lei Maria da Penha teve um salto exorbitante de até 238%, o que reflete a alta demanda por informações sobre o tema.

Para pode alertar sobre esse grave problema que chega em milhares de lares, a F.biz e a Vetor Zero criaram o filme “Call” que chocou a internet com seu realismo. Todos foram impactados pelo vídeo nas redes sociais, o que parecia ser apenas mais uma vídeo chamada que deu errado, se tornou cena de filme de suspense. 

Pensando na realidade de inúmeras casas, o filme “Call” mostra como uma mulher que está sofrendo violência doméstica usa o momento de uma videoconferência de trabalho para pedir ajuda. A campanha feita para o Instituto Lei Maria da Penha destaca como o apoio das pessoas ao redor da vítima é importante, especialmente para incentivar a denúncia.  Em conversa com Adriano Alarcon, CCO (Chief Creative Officer) da F.biz, conseguimos nos aprofundar e entender muito mais por trás da campanha, como sua criação e importância. Confira entrevista completa: 

 

AD: Como foi participar desse projeto que possuiu uma grande importância para as mulheres?

Adriano Alarcon: Tanto para mim quanto para todos os envolvidos no projeto foi muito valioso, pois somos conscientes da importância da causa e das mensagens que precisam ser levadas até o público. Por isso, fomos minuciosos em cada detalhe. Essa é uma causa que afeta diretamente as mulheres, mas também afeta a sociedade como um todo. A violência doméstica é mais comum do que parece e mais presente do que imaginamos, e é por isso que precisamos nos unir como cidadãos para combater uma situação que afeta diretamente as vítimas, mas também, mães, pais, filhas, filhos, amigas, vizinhas e todo que as cercam. Por isso, é tão importante deixar claro que a vítima não está sozinha, que ela pode contar com toda rede de apoio. Nossa campanha é um convite para nos tornamos parte dessa rede, saindo do papel passivo do indignado quieto, para o agente transformador de mudança, que toma uma atitude.

 

AD: De onde surgiu a ideia da campanha? Conte-nos um pouquinho sobre o brainstorm da campanha.

 Adriano: Nestes últimos dois meses, houve um salto expressivo no número de casos em decorrência do período que vivemos e achamos que seria o timing ideal para escancarar que a violência doméstica acontece em todas as classes sociais e que podemos ajudar muitas mulheres se formarmos uma enorme rede de apoio. A campanha “Call”, uma co-criação entre F.biz e Vetor Zero, cumpre o papel de alertar sobre o aumento alarmante do número de casos. Falando especificamente sobre o processo criativo, posso dizer que foi facilitado devido uma prévia parceria entre o Eduardo Battiston – um dos diretores da dupla Coutinho & Batti – e eu, quando trabalhamos como dupla fazendo a gestão criativa digital em uma outra agência. Nesse processo de co-criação, juntamos criativas e criativos, especialistas e colaboradores, que depois de muito debate, chegaram em uma mensagem importante para o momento que vivemos hoje e que ao mesmo tempo, promove um shift na comunicação do Instituto Maria da Penha (IMP). Até então, a mensagem estimulava a vítima a realizar a denúncia e nesse momento de isolamento, onde muitas vezes a vítima não consegue se distanciar do agressor, trouxemos por meio do storytelling, o convite para que os colegas fiquem atentos aos sinais. Muitas vezes, um pequeno detalhe está encobrindo uma situação de opressão e um possível pedido de ajuda.

 

AD: Quais foram as etapas para a produção da campanha?

Adriano: A produção da campanha aconteceu de forma muito rápida. Em menos de duas semanas, foi possível passar por todas as etapas de brainstorm, pré-produção, aprovações, finalização de distribuição nos canais de mídia e nas redes de apoio. O core da ideia que simula uma chamada de videoconferência, situação que se popularizou por causa do home office, permitiu que a captação fosse feita à distância e de forma segura, com cada ator em sua própria residência. Por outro lado, foi um processo desafiador para a dupla de diretores Coutinho & Batti, que precisaram encontrar o tom de voz correto: mais acolhedor e menos alarmista, uma interação natural entre os atores e, principalmente, trazer para o espectador a angústia de quem está observando uma situação fictícia que simula a vida real com perfeição. E tudo isso feito à distância!


AD: Para muitos, o choque inicial foi por pensar que o filme era de fato real. A agência buscou essa ideia na hora da criação? Como foi feita a produção do vídeo?

Adriano: Dentro da agência temos um time que acompanha a sensibilidade do tema, mapeando os índices oficiais no País e, principalmente, como as pessoas se manifestam sobre o assunto em blogs e nas redes sociais. Isso nos dá o pulso para priorizar esforços. O que diferencia a campanha “Call” dos outros esforços de comunicação é representar algo que não está registrado nas redes sociais, ou nos depoimentos voluntários das vítimas, que é de fundamental importância para o encorajamento de outras vítimas.  Essa campanha buscou simular uma situação real para mostrar para todos que alguém próximo a você pode estar precisando de ajuda e que é responsabilidade de todos estar atentos aos sinais e ajudar a vítima. O vídeo conseguiu trazer isso de forma muito verdadeira, nos pequenos detalhes ao longo da história, criando no espectador a sensação de incapacidade, na qual você gostaria de estar lá e ajudar. Ver que apenas uma das colegas de trabalho foi capaz de perceber a situação de abuso leva todo mundo a pensar qual dos personagens do filme seríamos: a amiga que faz a diferença ou o colega de trabalho que parece não entender tanto o fato vivido no filme como a condição da violência doméstica.

 

AD: Qual a importância de informar sobre violência doméstica e que existem canais de denúncias?

Adriano: Todos os dias, somos impactados por notícias de mulheres que foram assassinadas por seus companheiros ou ex-parceiros. Na maioria desses casos, elas já vinham sofrendo diversos tipos de violência há algum tempo, mas acabam ficando ao lado dos agressores por medo, vergonha ou falta de recursos financeiros, sempre esperando que a violência acabe. Muitas desenvolvem uma sensação de isolamento e ficam paralisadas, sentindo-se impotentes para reagir, quebrar o ciclo da violência, sair dessa situação. Por isso, a informação e o acolhimento são essenciais, tanto para a fase de aceitação por estar em um relacionamento abusivo, quanto para o encorajamento pela denúncia. E para denunciar, as mulheres devem procurar, em primeiro lugar, um Centro de Referência de Atendimento à Mulher (CRM) em sua cidade. Nos locais em que não existe esse equipamento, é possível acionar o Ligue 180, um serviço disponibilizado pelo Governo Federal que funciona 24 horas por dia durante todos os dias da semana. Em casos de emergência, devem ligar para o 190.

 

AD: A violência doméstica é um dos casos mais traiçoeiros por conta de seu silêncio. Quais maneiras podemos quebrar isso?

 Adriano: Começa pela empatia. Falar com amigas, colegas e vizinhas, procurar saber como elas estão vivendo esse período de isolamento social. Não julgar, ouvir e, principalmente: acreditar. Acompanhar e respeitar a jornada na decisão pela denúncia, que nem sempre é imediata. Deixar claro que ela não está sozinha. Por fim, se a mulher achar que sua vida corre perigo, mas mesmo assim, não quiser denunciar – seja por medo, dependência financeira ou outra situação –, ela pode conseguir uma medida protetiva mesmo sem fazer o Boletim de Ocorrência (BO). O importante é estarmos atentos aos sinais para formarmos uma enorme rede de apoio.

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