Skip to main content

Por Diego Orenstein – advogado e VP of Legal da BBL 

Com o advento da tecnologia blockchain no cenário de criptomoedas, era só uma questão de tempo para que videogames começassem a surgir nesse nicho. Na prática, já existem no mercado diversos jogos eletrônicos que utilizam sistemas de blockchain ou algum outro mecanismo do tipo “pay to win” (pague para vencer, em tradução livre).

Como funciona na prática um jogo com tecnologia blockchain?

A premissa básica é a seguinte: ou o jogo é gratuito para começar a jogar (free-to-play), ou exige-se do jogador uma espécie de pagamento de entrada, geralmente em criptomeda. Durante a jogatina, o jogador pode ganhar ativos dentro do jogo (in-game assets) na forma de tokens não fungíveis (NFT). Caso você ainda não saiba o que é uma NFT, trata-se basicamente de um ativo único e exclusivo, como uma obra de arte, só que de forma digital.

Especificamente nos games, as NFTs tendem a ser itens dentro do próprio jogo, como armas, skins cosméticas (trajes e roupas, por exemplo) ou outro tipo de colecionável.

Tendo em vista as premissas acima, como esse sistema de NFT se difere do sistema tradicional já conhecido por todo mundo que joga algum tipo de vídeo game, isto é:  o de se ganhar itens no curso normal do jogo ou mediante realização de micro transações com moedas do próprio jogo (in-game currency)? A diferença está justamente no sistema de blockchain: devido ao fato de tais ativos estarem armazenados em uma blockchain pública, o jogador passa a ser o único “detentor” dos itens adquiridos dentro do jogo.

Dessa forma, se algo acontecer com o servidor do jogo ou se o seu desenvolvedor, por qualquer motivo, decide desativá-lo, o item adquirido pelo jogador ainda existirá na blockchain pública. Isso de certa forma preserva algum valor real sobre o item (NFT), enquanto ainda houver demanda para tal item, é claro. Além disso, a tecnologia de blockchain possibilita a “intercambialidade” de itens entre jogos diferentes, mesmo que de desenvolvedoras distintas, desde que esses jogos permitam tal intercambialidade dentro do seu código-fonte. Exemplificativamente, seria como adquirir uma skin de Fortnite (jogo da Epic) e utilizá-la numa partida online de Call of Duty – Warzone, (da Activision – agora Microsoft).

Alguns títulos populares baseados em blockchain já existem no mercado de games, como o jogo “Axie Infinity”, que detém uma ampla base de jogadores aficionados, alguns deles, inclusive, lucrando alto com a venda de NFTs sob a forma de itens colecionáveis adquiridos no jogo. Essa fórmula deixa o jogo  ainda mais atrativo em termos de experiência, uma vez que os jogadores têm a possibilidade de receber algum retorno financeiro pelo tempo investido dentro do jogo.

Uma deficiência que se percebe em jogos baseados em blockchain é que eles ainda são concebidos sob a estratégia mercadológica de se realizar transações depois que o jogo foi adquirido, prejudicando, de certa maneira, a experiência que o jogador pretendia ter quando pagou pelo título e trazendo à tona aquele velho debate sobre micro transações: “se eu já paguei pelo jogo, por que tenho que gastar mais dinheiro dentro do jogo para me divertir?” Nessa linha, as NFTs já são vistas por alguns críticos como “truques” para alavancar as vendas de um jogo, tornando-o mais atrativo. O problema é que absolutamente qualquer coisa pode ser transformada em NFT e qualquer NFT pode facilmente se transformar em algo com pouco ou nenhum valor real.

Ainda há o fato de que muitos jogos baseados em blockchain possuem características de jogos “freemium” ou “pay to win”, em que o jogador precisa gastar dinheiro real na expectativa de se obter alguma vantagem competitiva. Tendo isso em vista, a Valve, por exemplo, já baniu jogos de blockchain da Steam (maior loja online de jogos), provavelmente por causa dessa preocupação.

A bem da verdade, jogos em blockchain já são vistos com certo receio pela comunidade gamer, principalmente depois que uma desenvolvedora vendeu uma série de NFTs antes do lançamento do seu jogo para capitalizar a operação, e logo depois simplesmente desapareceu do mapa. Por outro lado, alguns players importantes da  indústria de games sinalizam que jogos baseados em blockchain terão um papel significativo no futuro dos games, como a Ubisoft e a EA, esta última com o seu CEO declarando abertamente que conteúdos digitais colecionáveis serão uma parte considerável da estratégia da publisher no futuro.

Do ponto de vista do consumidor, a tecnologia de blockchain poderá ter um impacto no preço dos jogos, seja para reduzir os custos ou para aumentá-los. Explicamos: enquanto por um lado é possível desenvolver jogos mais baratos, transferindo certas tarefas para servidores dentro do blockchain público ao invés de usar servidores próprios, de outro lado poderá ocorrer um aumento no valor dos itens ou personagens dentro de um jogo e que sejam necessários para o jogador tornar-se competitivo.

Por exemplo: no caso do jogo Axie Infinity mencionado acima, o jogador precisa gastar cerca de mil dólares para comprar um time razoavelmente competitivo dentro do jogo. Por outro lado, existem jogos e iniciativas baseadas em blockchain que focam mais no aspecto de colecionador do que na mecânica pay to win, como o título Supdrive,  o qual oferece jogos no estilo retrô, em que os jogos em si são as NFTs, cada qual tendo as suas próprias artes, cores e dificuldade, tornando-se únicos.

Em outras palavras, o conceito de blockchain no mundo dos jogos ainda está em fase embrionária e deverá se aperfeiçoar ao longo do tempo, de modo que os seus impactos sejam mais benéficos do que negativos para os jogos e jogadores de forma geral, desde que, é claro, não tenhamos que gastar fortunas com NFTs para nos divertir com os jogos que amamos.

Quer saber mais? Não deixe de seguir o ADNEWS nas redes sociais e fique por dentro de tudo!

Leave a Reply