Este vírus, invisível e desumano, virou a nossa vida de cabeça para baixo: segundo a Unesco, metade dos estudantes do mundo está sem aulas. A OMC afirma que o comércio global recuará 32%, o Datafolha diz que 69% das pessoas vão perder renda e a Ibre-FGV informa que a Covid-19 deixará 12,6 milhões de pessoas sem trabalho, mais que dobrando a taxa de desemprego atual. Tudo parece um filme de ficção, mas não é. Tudo é real e está acontecendo bem aí, na frente das telinhas que estão em frente aos nossos olhos.
Este vírus, que não enxergamos, se torna instantaneamente visível para aqueles que precisam de uma máscara, um respirador, um leito de hospital ou, simplesmente, para aqueles que precisam socorrer pessoas mais vulneráveis.
Mas o objetivo deste artigo não é retratar a vitrine do caos a que estamos assistindo. Nem é falar do novo normal que surgirá no pós-crise. Quero falar do presente, deste que é o único tempo que existe e que de verdade importa para nós. Quero falar das coisas que, como o coronavírus, insistimos em não ver, mas que estão por aí, ao nosso alcance; das oportunidades que pessoas não conseguem ou não querem enxergar, principalmente em momentos como este de crise.
Sou um dos empresários do live marketing. Uma indústria quase invisível, mas que está presente na vida de milhões de pessoas, cuidando das experiências e do relacionamento que elas têm com produtos, serviços e marcas todos os dias. Nesse setor, realizamos cerca de 590 mil eventos e, de forma direta ou indireta, geramos 25 milhões de empregos bem como representamos 12,93% do PIB de nosso país. O fator gerador de negócios de nosso mercado tem a força de transformar cada R$ 1,00 investido em R$ 35,00 de retorno para toda a cadeia produtiva que representamos.
Esses são números impressionantes de um mercado que está parado, mas que vai se reinventar e continuar contribuindo para o país. Minha agência é de porte médio. Nosso faturamento hoje está reduzido em 60%, número que reflete negócios fechados no começo do ano. Ou seja, ainda devemos descer um pouco mais, antes de enxergarmos a luz no fim do túnel e voltarmos a subir.
E o cenário descrito acima é o que temos para hoje. É o que temos estampado bem em frente aos nossos olhos. Então vamos ao trabalho, tentando colocar a capa da visibilidade nas oportunidades que muitos já estão enxergando a partir desta realidade.
Os eventos, hoje essencialmente virtuais (sem grandes novidades, pois eles já faziam parte do portfólio de muitas agências), voltarão a ser híbridos ou presenciais. Mas percebemos que agora ousamos explorá-los inteiramente, resultando em experiências muito mais positivas para as agências e para os clientes. Os clientes estão conseguindo otimizar suas verbas investindo em melhores conteúdos e atrações, turbinando o acesso e a audiência de seus eventos. Para o nosso lado, a escassez de possibilidades tem produzido agências mais estratégicas e criativas, com baixo volume de trabalho, mas com melhor rentabilidade para o negócio. No mundo virtual, elas não precisam mais usar grandes capitais de giro para antecipar o custo dos eventos presenciais dos clientes. O que é muito bom, pois, exigir que um fornecedor pague sua conta e só receba depois de 90 ou 120 dias é uma prática predatória, forçada pelos clientes, quase que um vírus invisível para muitos do mercado.
Para clientes e agências, o efeito colateral mais visível da crise é a experimentação. O trabalho remoto é possível. Uma cidade sem trânsito é possível. Ficar em casa é possível. Tudo pode ser possível desde que a gente acredite e experimente. Dê uma chance para fazer diferente, tente. Comece se protegendo com a diversidade de pessoas em seu quadro de colaboradores ou amigos, para não cair na tentação de fazer tudo igual.
Hoje uma empresa pode ter todos os colaboradores participando de seus maiores eventos (antes conseguiam reunir presencialmente no máximo 20% dessas pessoas). Já estamos criando festas de final de ano com celebridades nacionais ou globais, fazendo lives exclusivas para empresas que antes não podiam contratar, por ausência de budget ou não ser politicamente incorreto mesmo. Produtos são lançados globalmente com plateias virtuais lotadas de jornalistas especializados ou público consumidor. Os congressos podem contar com especialistas globais. As feiras de negócios, antes tão carentes de reinvenção, podem ser sua próxima viagem virtual pelo conhecimento. Tudo ficou mais acessível e democrático. O público pode escolher assistir a algo “just for fun” ou o participar do evento que oferece o melhor conhecimento disponível no mundo.
Isso mostra que tudo está mudando, independentemente de você querer ver ou participar. Pense nos correios, por exemplo, que continuam existindo e transportando as encomendas que nos salvam no isolamento. Já as cartas não existem mais. Tem muita coisa acontecendo na frente dos seus olhos que os fãs das crises já estão vendo e transformando em oportunidades. Em contraponto, ainda vemos pessoas que continuam viradas para um passado que não existe mais, ou que ficam isoladas pensando no futuro, que nem sabem como será. E neste momento é importante lembrar que não devemos desviar nossa atenção para direita ou esquerda; o tempo presente, que produz resultado e que dá certo, exige que se olhe para a frente.
E por falar no que está na nossa frente, a crise também nos trouxe tempo para sermos mais humanos. De voltar a enxergar super-heróis pela cidade e agradecer toda vez que somos salvos por motoboys, enfermeiras, porteiros, frentistas, jornalistas e tantos outros exemplos de seres super-resistentes que encontramos por aí. E este presente que está na nossa frente também nos trouxe tempo de ficar em casa, ler, jogar, brincar com as crianças ou o cachorro. Tempo para abraçar quem está visível ao nosso lado, mas que muitas vezes insistimos em não enxergar.
Por Ronaldo Ferreira Júnior é conselheiro da Ampro – Associação das Agências de Live Marketing e sócio-fundador da um.a #diversidadeCriativa, empresa especializada em eventos, campanhas de incentivo e trade.
Fotografia por: Peter Adams-Shawn